quarta-feira, 25 de junho de 2014

Pedaços de mim


Em dias de silêncio e chuva eu sempre me encontro nas estradas de minha mente. Nesses encontros conversamos por horas a fio sem se preocupar com o tempo, com o vento, com a chuva que cai, com o raio que vai. Entre as conversas compartilhamos fatos, casos, dizeres e retratos. Retratos estes , e cartas por vezes, que trazem de forma visual e palpável um pedaço de mim, um pouquinho do meu passado. Vejo os traços, os laços e os embaraços que marcaram em mim, livro de pele, momentos de paz e de guerra, momentos de amor e de dor, de prazeres e deslizes de quem tenta e cai, se levanta e não desiste.
Mas recentemente foi diferente. Veio novamente aquele vento, a quente corrente no ar e por fim a chuva... E lá fui eu me encontrar na estrada, desenvolver uma cantada em mim e assim buscar registros vivos com o intuito de me sentir feliz... Mas não estavam lá! Os registros foram deletados, os retratos cortados, as canções dissolvidas... Não havia pedaços de mim, não havia no que me apegar! Sem cartas para molhar com minhas gotas salgadas, nem fotos para beijar com minha boca ressecada... Estava vazio. E o vazio gritou em mim.
Tentei buscar na memória aquela tal história do final feliz, do "4ever", do "sou seu e você é minha". Mas não vi a cor. Tudo o que havia construído, todos os tijolos de cartas e fotografias foram derrubados e antes inabalados, sucumbiram diante de mim... Dentro de mim.
Em meio ao vazio lembrei-me da última limpeza, daquele momento do esqueça- não voltará, o que passou, passou...- e tudo então ficou assim, meio cinza, caído, semblante abatido por ter jogado fora pedaços de mim.
Sei que as memórias resistirão ao tempo. Mesmo sem os registros históricos para confirmar, sem as lembranças visuais para me fazer chorar, elas estarão ali, dançando no descampado espaço do meu ser. Percebi que em mim, fazer limpeza emocional e dos arquivos físicos da emoção vivida é um ato de amputação, por mais necessária que seja, sempre sentiremos falta do que foi tirado.
Eu não fico presa no passado, mas não quero amputá-lo. Cada página da minha história foi minuciosamente escrita para que ao passar do tempo fosse lida e compreendida. 
Não fique estagnado no passado, mas não jogue seu passado fora. Aprenda a viver com ele. Que graça tem um palácio sem histórias, um castelo sem memórias? 

Léia Dantas - Beijomeliga



Nenhum comentário: